fully clothed i stand
invisible my lying naked body
laughing i greet
invisible my crying bared soul
loudly i shot
invisible my tiny whipering voice
fast i run
invisible the fairy steps i make
higher i jump
invisible the hardness of the fall
não te chamei
não te pedi
vieste
pela margem da fala
alice te abençoo
neste tremor de palavras aflitas
vejo-te na paz da escuridão
e não conheço o teu rosto
mas a palavra
essa entidade divina
é capaz de nomear um rosto
semear melodias
na surda ausência do grito
alice do país das ignotas maravilhas
alice dos mágicos amanheceres
tens em mim
a lágrima
o extremo do sorriso
e estas mãos suplicantes
que te abençoam
ao chegares anónima
à página em branco
onde começam todas as utopias
e a palavra ama
como uma boca sedenta de luz
quando a treva
ameaça com o seu olhar de sombra tombada
diz-me alice
que me queres à cabeceira dos sonhos
que me sonhas no prado polvilhado de estrelas
alice vem até mim
no doce ondular
da madressilva
a minha morada
cheira a tílias
e o meu sangue chama por ti
num fio de orvalho
mostra-me como pulsa a tua alma
inventa-me no presente
aloja-me no segundo coração
onde o passado a que pertencias
se transformou na fonte
cuja àgua limpida e primordial
apaga todos impossíveis
dá-te a conhecer na palavra mínima
vem até mim na nota máxima
(...)
*
autor: Alberto Serra
quando os teus olhos se abrem
o mar dilata a terra em ondas brancas
repara
não é quando abres os olhos
fechados cobrem horror e espuma fétida
cosidos na cara tecem dunas subaquáticas
palmos de areia pálida
raízes secas e rugas desidratadas
é a tempestade que as rega
o infortúnio vence as marés cheias de ócio
a sede avança sobre a dormência ingrata
os monstros marinhos rompem as pestanas
e começa na boca
quando os teus lábios se abrem
repara
não é quando abres os lábios
fechados tapam cavernas naufragáveis
cosidos no rosto salvam as palavras
verbos fecundos que atravessam os rios ágeis
poemas férteis por entre as cáries
é o sal que os mata
o torpor das algas na garganta
o cume das vagas redundantes
o cu da noite ali deitado
e acaba nos pulsos
quando as tuas mãos se abrem
repara
não é quando abres as mãos
fechadas cercam oceanos
cosidas no peito são duas caravelas
é quando os teus olhos e os teus lábios se abrem
que as tuas mãos voam
*
acrescento importante comentário de vasco pontes, a quem agradeço a referência: "De Camões a Pessoa - AViagem Iniciática (SeteCaminhos), com pinturas e textos de Ellys e poemas de Maria Azenha, é o livro que será apresentado na Casa Fernando Pessoa no próximo dia 17 de Julho pelas 18h30"