2006-08-18

morte de simães



um dia
virás aqui ler-me
tu ainda não sabes
das gaivotas surdas que tombam
nem dos tigres velozes
nos meus ouvidos
um dia
saberás da luta das aves
e do tremor da terra
enquanto fumas

um dia
virás aqui ler-te
eu ainda não sei
das correntes mudas que prendes
nem das cutículas pendentes dos teus dedos
nos meus dentes
um dia
saberei do cheiro
que guardas fora dos livros
e do poema que amas
na porta do meu corpo

um dia
virei aqui ler-me
tu ainda não sabes
da região do vinho do meu sangue
nem da curta metragem das horas
nas tuas cordas vocais
um dia

saberás do tempo
e do interruptor
que apaga o medo

um dia
virei aqui ler-te
eu ainda não sei
das patas nervosas que aumentas
nem dos olhos cansados
na pele do meu rosto
um dia
saberei dos dias que matas
e dos cadáveres
que comes ao jantar

um dia
viremos aqui ler-nos
ainda não sabemos a data
que escorre na janela
nem a saliva do beijo
da mulher que te pede um cigarro
um dia
saberemos ser dia
depois da madrugada

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