2006-08-18

ao telefone



tenho estado a ampará-la
à minha vulva
porque ela quer voar
nas asas da tortura
das tuas palavras
porque as tuas palavras
já não são palavras
cada uma das tuas palavras
é um dedo das tuas mãos
ao início
os teus dedos aproximam-se dela
para alisá-la
os teus dedos têm olhos nas pontas
cada olho vê um recanto diferente
da minha vulva
os olhos dos teus dedos
ficam expectantes
diante da fragilidade dela
e tocam-lhe
começam a acariciá-la
é tão frágil
tão dócil
tocam-lhe para a proteger
alisam-na lentamente
acariciam-na longamente
até que ficam cegos
os olhos dos teus dedos cegam
e começam a dedilhá-la
ameaçam-na
ela começa a cuspir
a minha vulva cospe nos teus dedos
eles estão cegos e molhados
já não a protegem
comem-na
num imenso movimento profanatório
desenham círculos à volta dela
apertam-lhe os lábios
metem-se lá dentro
primeiro um
depois outro
a comê-la
como bocas
as tuas palavras
já não são palavras
cada uma das tuas palavras
é uma boca a comer a minha vulva
todas as tuas palavras
são bocas em cima dela
tantas bocas têm os teus lábios
quando a beijas
é para acalmar o castigo dos teus dedos
aproximas a ponta da língua
e desenhas um verso
ela está molhada
e gosta da tua saliva
e cospe na tua língua
e tu juntas a boca
os teus lábios sobre os lábios dela
num beijo prolongado
comem-se
e tu também cospes
com a tua boca
lá dentro
e ela começa a arder
a tua saliva está tão quente
dá-lhe lume
acende cada poro dela
em cada esquina
há uma chama de fogo
por tua causa
as tuas palavras
já não são palavras
as tuas palavras são pénis
cada uma das tuas palavras
é um pénis a cheirá-la
até que todas as tuas palavras
se transformam num só pénis
no teu pénis viril
quando o teu pénis
entra dentro da minha vulva
ela queima
está tão quente e húmida
o teu pénis começa a arder
começa a profaná-la
o fogo sobe nas paredes dela
e o pénis cresce por dentro
em investidas de água
e mais investidas
e mais água
já não são palavras
o que escreves
são dois corpos encaixados
na profanação
são línguas de fogo a subir pelo corpo
em forma de dedos cegos
são bocas em chamas
beijos aflitos
mamilos espetados na angústia
até que os lambes
vens com a tua boca a arder
da vulva sobre os mamilos duros
e desfazes os caroços nos dentes
devagar
tão terno
sempre a enterrares o pénis
dentro dela
sempre mais
até que as mamas dançam à tua frente
desafiam os teus olhos
provocam os teus dedos
e as apalpas
torces os bicos nas palmas das tuas mãos
as tuas palavras dançam
comem-se
encaixam-se
apertam-se
vêm-se

*

(fotografia de eric kellerman)

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