2006-09-22

para a bélinha




no dia vinte e seis. fazes vinte e sete anos. não sabes ler nem escrever. no teu bilhete de identidade. carimbaram no lugar do teu nome. não sabe assinar.
quando estavas dentro da barriga da mãe. veio uma ambulância. em serviço de urgência. contra o carro dela. depois nasceste e levaram-te para a incubadora. danificaram-te o cérebro. não vou escrever a palavra negligência. eles não sabiam que vinhas perfeita.
começaste a crescer com o tempo. mas devagar. demoraste a falar. gatinhaste muito antes dos primeiros passos. até que andaste e caíste. os anos parecem ter sido uma sucessão de quedas. eu chamo-lhes conquistas. pequenos grandes voos de vontade.
a tua vida conta inúmeras rejeições. tantos se afastaram de ti. eles têm medo, sabes. e inveja da tua luz. porque a beleza macula as impurezas. quando devia ser ao contrário.
a mana gostava de te contar muitas coisas. chegar a casa e poder conversar sobre o dia e as paisagens. mas tens uma tesoura nas mãos. uma bacia no colo. e rasgas todas as minhas cartas.
de castigo. não vou ver-te à escola. raramente apareço no teu abraço. e ainda assim. apesar de imperfeita. gostas de mim. e não há um dia que a tua ternura se acabe. não há vento que apague o calor do teu afecto. não há nada que impeça o teu amor límpido. não há rio igual em toda a superfície da terra.
a mana quer ser como tu quando for grande. mas tu és muito maior do que eu. e no dia em que o meu nome se calar na tua boca. no último dia em que as palavras não forem à faca. nesse dia. o meu coração pára.

da tua lili




*


(fotografia de domenique heidy)


*


volto em outubro. até lá, fico de voz calada. obrigada, vanessa, pelo teu regresso. beijo,


alice

2006-09-15

até já



agradeço sinceramente:

- à madalena, pela ajuda incansável no dashboard, bem hajas

- ao porfírio, porque fico em dívida contigo, não me esquecerei

- à bárbara, pelo prefácio que hás-de escrever no meu livro

- à carolina, pela tua presença inequívoca em cada momento

- à mariana, pela solidariedade que tiveste sempre comigo

- à ana maria, pelo estímulo constante da expressão escrita

- ao carlos josé teixeira e ao amândio santos, vocês são especiais

- à isabel mendes ferreira, à vanda, à claudia, à paula, à sofia, à vanessa, à fátima, ao legível e ao miguel, pelo vosso companheirismo e apoio incondicionais

- a todos, pelas vossas visitas, comentários, links e citações

agradeço a todos, porque amar palavras é amar pessoas


um beijinho do meu coração,

alice


*


Tu não sabes
Quantos rios se vão deter,
Quantos olhos vão beber
Nas palavras que colaste
Junto ao peito


pedro abrunhosa, álbum momento


*

(fotografia de márcio farias)

2006-09-14

o horizonte




o mar
esse oceano de algas verdes
essa abundância de ondas
de encontro às rochas
descasseadas de búzios
e pequenas conchas
esses peixes multicolores
essas areias pisadas
essas pedras brilhantes
e esse pôr do sol
longínquo
no horizonte
essas águias que
sobrevoam essas águas
os pássaros que chilreiam
fazendo um coro de vozes
um grupo de crianças
entretém-se a jogar à bola
uma menina constrói
um castelo de areia molhada
o fim da tarde sereno
numa praia em que o sol
se põe para além do mar
um horizonte calmo e fresco

*

copiado do meu bloco do 6.º ano de escolaridade
como é que eu aos 12 anos sabia o significado de "descasseadas"?

*

(fotografia de sílvia antunes)

2006-09-13

flores da alma



imagina que a tua cabeça
é um gira discos
e que o teu comportamento

é a agulha em cima do disco
quando estás bem contigo própria
ouves uma bela melodia interior
quando te portas mal
a música desafina


querido antónio,
muitas vezes tenho falado de ti e contigo. é hoje a primeira vez que o ponho por escrito. morreste. ainda sinto o teu olhar sobre o meu medo. o aroma da fragrância da tua barba. ainda me ajudas. penso no que me disseste. e tento afinar. tu sabes. não é fácil. cabecinha destravada a minha. foi há três anos. vinha eu do banco. setenta e cinco kilómetros de asfalto. a digerir a notícia. aquela palavra a rolar-me pela cara abaixo. cremado. fiquei muito zangada. isso não se faz. não se morre de um dia para o outro. não devia. e frustrada. e com raiva. a agulha aos saltos. o disco todo arranhado. o medo todo escancarado. o diabo à espreita em todo o lado. irreversível. a vida é mais difícil sem ti. dói. tentei dizer-te. mais tarde. num dia de chuva. como hoje. no cemitério. em vão. fazes-me bem. não te deixarei morrer. em mim. bela melodia.

*


talvez uma só palavra
talvez uma só missiva
pudesse mudar a agulha
de um coração à deriva

carlos tê, in "ninguém escreve à alice", in álbum avenidas, by rui veloso

*

(fotografia de márcio farias)

2006-09-12

tu em mim


a tua voz é de pele de pêssego
quando me ligas
deixa-me ouvi-la até ao caroço
porque é ao telefone
que os teus olhos falam





*


deve ser verdade, meu amor
estou a envelhecer
pela inclinação da luz
que as gruas despejam nas fachadas
percebo a burocracia das obras
que arrasa o teu coração



*


(Vou casar no dia 21 de Outubro. O meu pai mandou vir um fato do harrod’s e ligou ao fidel por causa dos charutos. A minha mãe fez-me o vestido e costurou-me a virgindade com anestesia local. Só eu conheço o impedimento a este matrimónio: o noivo.)

*

(fotografia de pedro rodrigues)



2006-09-11

nonsense



estava eu a dormir quando de repente caiu um avião
lentamente, o pânico foi descendo na minha cama em figura de gente
uma criança agarrou a minha mão livre sobre o lençol e disse-me:
- quero fazer chichi
eu apercebi-me das chamas entre as almofadas e ofereci-lhe bolachas para as insónias
quando as lágrimas apagaram o fogo, apontou o aparelho em cinzas:
- esqueci-me da boneca
apesar dos corpos queimados no colchão, não terá sido esta perda a maior calamidade?


*

(fotografia de ricardo fernando silva)

2006-09-08

sede



... Um poema não se faz, porém, de ideias, antes de palavras. E a palavra escrita, nada mais é do que uma palavra muda. Este estado de mutismo da palavra, só se altera quando ela se revolve nos lábios de quem a lê e lhe dá voz. É na leitura da palavra, seja ela a palavra que for, que a palavra vive. Enquanto escrita, a palavra não passa de uma quantidade de água dentro de um copo. É preciso beber a palavra, engoli-la e incorporá-la para que possa ser sentida e deformada. Este processo de ingestão das palavras, varia de acordo com a quantidade de água que está dentro do copo. E a palavra só se sente, só se deforma, quando se engole e integra em nós, ficando o copo de água vazio...

(alice, 2003)

*

"porque este espaço é feito do que me toca. porque é feito do que me traduz e em noites assim deixai sempre falar quem melhor sabe e melhor decifra as palavras. por quem as ama. porque eu apenas amo no limite de não saber de que é feita a chuva do meu corpo"

obrigada, a, por me teres citado e por estas palavras tão bonitas... um grande beijinho para ti, bem hajas

*

(fotografia de berenika)

ilhozes de gelo



Hoje fui por dentro do crime
Viajei no interior da bala
Directa ao teu peito
Havia um menino a brincar
Encolhi no mar
A saltar às cordas

Hoje fui por dentro do ciúme
Procurar um destino
Ou um assassino
Havia uma vela a arder
Derreti em seda
A bater às portas

Hoje fui por dentro do sismo
Beijei a garganta
Anti ciclone
Havia um bandido
Um tiro perdido
Com as letras tortas

Hoje fui por dentro da sida
Descobrir que a vida
Não choca icebergues
Havia um tormento
Mole de cimento
Nas ondas já mortas


*

(fotografia de pascal roux)

o poema incompleto



A morte…

… deve ser isto:

Um véu a cobrir-te
Um pano sobre a mesa
Um cinzeiro lavado
Quantos vultos a passar no ecrã?


… deve ser isto:
Um pau de incenso apagado
Uma poça verde na retrete
Quantos vómitos levantam o soalho?

… deve ser isto:
Uma folha de prata abocanhada
Um cordão à volta dos sonhos
Quantos cérebros coalham a verdade?

… deve ser isto:
Uma chama para o olfacto
Uma receita no armário
Quantos isqueiros acendem a lua?

… deve ser isto:
Um suspiro a fazer de vento
Uma corrente de ar nas escadas
Quantos orgasmos espremem os teus olhos?

… deve ser isto:
Uma erecção contínua deitada
Um espectro maldito de urticária
Quantos abismos te separam de um milagre?

… deve ser isto:
Uma palavra por inventar
Um verso à espera no carro
Quantos comprimidos salvarão a agonia?

… deve ser isto:
Uma galinha a fugir sem cabeça
Um veneno amarrado nas horas
Quantos fundos vazios te afagam a fome?

… deve ser isto:
Uma fila de garrafas usadas
Uma lixeira armada na varanda
Quantos preservativos ficam fora de prazo?

…deve ser isto:
Uma criança a crescer no caralho
Uma injecção de moral pelas costas
Quantos penalties farão de ti campeão?

… deve ser isto:
Uma invasão do teu próprio campo
Uma falta de respeito à porta de casa
Quantos cigarros restarão intactos?

… deve ser isto:
Maços de roupa a tapar buracos
Maçãs sem árvores fora da garganta
Quantos fósforos encontrarei à deriva?

… deve ser isto:
Raízes quadradas sem equação
Problemas ressonados na imaginação
Quantos rótulos serão afixados?

… deve ser isto:


*

(quadro de munch)

tsunami



já ouviste falar em reconciliação?
já te disseram que a morte é uma pedinte que anda na rua em corpos emprestados?
já te avisaram que vais morrer?
sabias que amanhã pode ser apenas uma palavra no teu testamento?
percebes agora porquê que as árvores crescem velhas e suportam tempestades?não ententes que a vida é um rio que corre para o mar?
compreendes porventura a foz entre o horizonte e a memória?
sabes ao menos quantos dias penduras no pensamento?
lembras-te de ser criança?
reconheces a infância e o encantamento dos pássaros?
quantas vezes respondeste que sim?
queres casar comigo?
pronuncias-te ou calas-te para sempre?

*

(quadro de jackson pollock)

quero-te



acordei húmida a pensar em ti.
com o coração a bater no clítoris.
e sei que este pulsar foi punição.
por ter procurado a tua mão.
fiquei deitada de bruços na cama.
a tentar aturar a imagem.
de quando vens sobre as minhas costas.
e do teu peso quando me penetras.
eu quero que me escrevas um verso no útero.
com os teus dedos e com o teu esperma.
agarra-me e desmaia comigo.
neste centro do universo.
a tua boca é um par de borboletas siamesas.
quero voar contigo.
quero afundar-me em ti.
deve ser esse o céu que deus promete.

*

(fotografia de autor desconhecido)

2006-09-06

paixão sofrida



Algo renasce e morre ao mesmo tempo, tudo com medo de poder ser desviante e de forma perigosa, alento de desespero que transtorna qualquer ser, é o máximo de sofrimento. O luto está instaurado neste turbilhão de sentimentos que merecem ser esquecidos. Tristes dias estes sem esperanças à vista, está tudo muito escuro, cinzento, apetece desaparecer para outra pessoa ou outro mundo… estou encharcada deste, nada me alegra, apenas aquele sorriso lindo e ternurento que me preenche. Que crise existencial, e nem falando nem agindo, nem nem nem nem é um pequeno enorme desentendimento com o meu eu. Quando isto terminará. Desde há alguns anitos que estes problemas têm feito, será o espelho que está todo estilhaçado? é horrível sentirmo-nos tão pequeninos quase inexistentes. Apenas a pele que se demonstra no exterior é que se tenta colocar a máscara para sobreviver nesta selva onde ninguém ninguém… ao fundo do túnel. ..estará a ser um mar vazio?
Porque não me vês, não me dizes algo, ignoras-me, não queres nada comigo, estou a persistir demasiado o que queres de mim, nada rigorosamente nada, então porque dás e depois tiras? Estás a montar um puzzle com os meus sentimentos é apenas um acto de charme para ver se me destróis e agora que faço diz-me…tens algo para me dizer ou apenas queres… não sei passar o tempo…Não tem nada a ver comigo…mas deixa, isto passa, não te preocupes, tudo passa, é uma questão de tempo, logo a seguir aparece algo para distrair a cabeça. OK? E nem um telefonema, nada rigorosamente, o silncio que paira no ar, será que irá enviar-me uma mensagem, não acredito.
Todos os dias tinha a esperança de algo acontecer, sonhava ontem nem consegui adormecer, estava bastante nervosa pois pensava que irias hoje reagir, mas infelizmente foi tudo em vão, porque me fazes isto, não sentes o mesmo, será que és assim tão bem formado que me envias uma sms para pedir desculpa simplesmente porque não tiveste tempo para mim.
E hoje como irás reagir, e eu irei ficar impávida e serena como se nada tivesse se passado.
Apenas o desprezo e a indiferença…estou farta dessas indiferenças, apetecia-me dizer que estou a sentir, era como se algo de mais profundo podia acontecer, afinal…
Mas não seria bom demais para mim, não é? Nunca irei ter esse privilégio, alguém sentir o mesmo ao mesmo tempo que eu.
Mas porquê? A mim acontece este tipo de coisas não dá para acreditar.
Só grandes desgostos, só grandes lutos, numa solidão que me atormenta a vida. As realizações estão aquém do esperado, o que desejava para mim, o que ambicionava nada …
Cheguei ao ponto de andar por arrasto, passo um dia de cada vez, por arrasto, e pedir a Deus que amanhã seja melhor. Que possa rir de felicidade nem que seja por momentos... Ou ter algumas realizações por momentos.
Aqui estou, no meu local de trabalho, à espera que o tempo passe para novamente meter-me no carro rumo a casa. É uma miséria de vida…tenho algo que me preenche, mas tendo estas ondas negativas que me invadem, já nem consigo ser ou ter capacidade para fazer alguém feliz.
Tirem-me deste filme… já chega…
tenho que o ultrapassar.
A inutilidade do ser o que faço aqui perdida sem saber a direcção correcta, o que queres da vida?


*

(texto de marília, quadro de júlio pomar)

*

"... junto te envio dois textos que gostaria muito que publicasses no teu blog e colocasses uma imagem..."

é para mim um honra publicar estes dois textos, obrigada amiga pela distinção, fico-te ternamente reconhecida, um grande beijinho para ti

da marília



Em termos de mudança, deixa a interiorização de sistemas que alternam com o sinónimo de compartilhar a eficácia ou não de uma estrutura capaz de fragmentar as alterações de uma macro situação anterior ao que se situa para além daquilo que não pode ser transportado.
Impede de ser o sustentável de toda a geração ao elevar os números e alcançar o propósito de que há muito era previsto. Assim, a filosofia tem como rumo o ser da questão que é simplesmente o facto de existir.
Podemos então estabelecer uma sequência lógica e alternada por suposições alienáveis do próprio ser. O ser pode ser transferido para a parte superior do pensamento. As conversações são bastante interessantes, resultantes do clima sentido e ultrapassado pelo homem que está para aparecer. No meio ambiente, a sensação pode colmatar a navegação pelo barco que transborda a água de cor azul. A escuridão pode ser vista como um prefácio do que pode acontecer e naquilo que é suposto acontecer. Mas no futuro, o barco poderá navegar pelo oceano ou simplesmente afundar na situação prevista.
Como tem sido discutido, a passagem de um ser para o não ser é perfeitamente clara, logo, as forças do vento saberão o que fazer. E tudo está direccionado para o objectivo principal que é enriquecer o indivíduo de uma postura adequada e complexa.
Vamos então fazer um resumo de tudo o que poderá acontecer, a questão coloca-se em aparecer o formato que é pedido ou não.
Questões que nunca devem ser colocadas para nunca serem respondidas.
A vertigem de cair e ser apanhado pelo vento é a sensação gelada do abismo. Vamos então idealizar o paradigma da construção do pensamento. Claro mas ambíguo, só um ser superior dotado de inteligência é capaz de o desmistificar e de explicar ao homem comum sua composição. A mentalidade e a transferência do negativismo parece contribuir de certa forma para o envelhecimento prematuro do indivíduo. A razão pela qual o enviezamento se ajusta a determinados comportamentos é o garante desta teoria idealista do ser. Parece bem dizer que todos temos aspectos negativos que nos alteram o caminho a percorrer e formatando o sentido da vida.
Perante a realidade interior e o desalinhamento da personalidade são aspectos relevantes do mítico de geração incapaz de se definir numa perspectiva evolucionista e desenvolver projectos capazes de sacrificar os múltiplos factores ambientais da raça humana.
São as quatro coisas que o rebento irá ser quando for grande, bonito, saudável, inteligente e amigo da mamã.
O túnel profundo e escuro, longe de ter um fim permitindo o extinguir da percepção do real e da ficção, tornando o barulho como entrave para o seu desenvolvimento precoce.
Voltando ao contacto da espécie humana é fácil de distinguir o que se torna a trapalhada das vivências ocasionais de pleno terreno.
A consequência da verdade pode ser a falha de uma vida inteira de evasões de conflitos que transformam o ser num imaturo e complemento dependente de outrem. Ao estabelecer as margem de manobra da situação de filtragem da ocasião e da paixão de universo resplandecente da liberdade da vida.
Logo se inicia a vida da satisfação e glorificação da alma que se irradia a luz da solidão.
Podemos falar da imensidão dos sentimentos sem deles esperar nada pois tudo o deseja fazer logo temos que nos distanciar da sombra que nos persegue.
Delirar permite as escorregadelas do espírito e das palavras que nunca devemos usar, pois nos trazem alegria e tristeza. Mas sofremos como aqueles que são infinitamente maus e sabem atormentar a vida de qualquer mortal.
Tempo e tempo que esgota sem darmos conta que por vezes desejamos que passe e outras que dure uma eternidade.
Amanhã acabará a luz dos teus olhos onde depositei os meus sonhos de realização e de paixão, ficará no amanhecer e no por do sol todos os desejos que racionalizei e senti por ti. Estás longe como se estivesses no buraco do sol e a brilhar, mas sem puder lá chegar, assim não sofreria as queimaduras do amor.
Vamos todos ficar presos às lembranças que estão no nosso consciente até que a alma desapareça e se transforme num turbilhão de raiva e de vingança. Encontro-me só nesta fileira de aberrações que me atormentam os meus pensamentos divinais e me arrasam de inveja de não puder compreender as suas reais pretensões. Vão embora pois já perdi a hora de voltar à alegoria do ser e do imortal das transformações mútaveis que despertam a curiosidade de alguém que pode perder tudo e morrer.
Escutar, que saturação ao ver que as palavras são apenas maneiras de expressão que nos cansam de desespero da própria realização, portanto, nada escuto, logo, nada sinto e quero esquecer a imensidão de palavras que pairam no vazio das cortinas da luz.
Esqueço porque quero, apenas penso e tento analisar as acções que se arrastam pelo barulho infinito da boca de alguém que não pára de falar e polui o ambiente na versão invariável e irracional de atormentar a vida humana do animal vestido de homem cruel.
Vejo coisas que mais de cores e fusões da libido consegue alcançar, permitindo a fobia de não estar e fugir para o universo alienável do corpo.
Recordo a inveja do trauma da percepção pública do esgotamento das ideias da poesia e transferir o lado perverso para a polidez da nudez.
Entendo como será bom ir para a sensação de glorificação da pele morena e da plena robustez das chacras dos lábios famintos de gestos incontroláveis da arrelia.
Faço o exagero de estar sozinha e controlada para não perseguir o caminho que não posso direccionar e relacionar com os outros.


*

(quadro de leonardo da vinci)